
A saúde e a educação são áreas em que a inteligência artificial tem encontrado um vasto campo de aplicações, ao mesmo tempo em que traz desafios éticos relevantes. Nesse contexto, os dois primeiros painéis do segundo dia do seminário "Rio como polo de IA aberta e soberana" reuniram especialistas que apresentaram iniciativas de êxito nas duas áreas e debateram as fragilidades a serem superadas. Promovido pela Finep, em parceria com a Secretaria Municipal de Ciência e Tecnologia e com o BNDES, o seminário foi transmitido pelo canal da Finep no YouTube. Veja fotos do seminário.
Superintendente da Área de Saúde e Transformação Digital da Finep, Joana Meirelles comentou sobre o momento favorável que o Brasil vive para o desenvolvimento da IA, "com uma política industrial clara – traduzida pela Nova Indústria Brasil – e o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial, que aborda infraestrutura, soberania e interoperabilidade de dados". Além disso, há disponibilidade de recursos, informou Joana, destacando o apoio da Finep e também o estímulo que a Financiadora tem dado à aproximação entre academia e empresas "para que os projetos mais estratégicos saiam do papel".
No painel sobre IA na saúde, foi bastante ressaltada a questão da sensibilidade dos dados e os riscos associados. Raphael Haddad, coordenador de Inovação e Saúde da Dasa, e Felipe Regis, gerente de Dados do Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino, abordaram a forma como trabalham com suas equipes na construção e no controle da trajetória dos dados. "A qualidade do dado é fundamental para a sua transformação em conhecimento", afirmou Haddad.
Gerente do Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos da Fiocruz, a tecnologista Luiza Silva apresentou a Rebec@, primeira inteligência artificial generativa do mundo testada e treinada para auxiliar no registro de pesquisas clínicas. Professor e tecnologista do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), Clécio Roque De Bom destacou a transdisciplinaridade: "A IA é multipropósito. A mesma tecnologia que eu uso para medir a taxa de expansão do universo, posso usar para fazer a inversão sísmica e apoiar empresas de óleo e gás. Um código que identifica eventos explosivos no céu pode ser usado para diagnóstico de câncer. A força da inteligência artificial está exatamente na capacidade de transgredir as áreas de pesquisa", disse. Como moderador do painel, Marco Vargas, professor da Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense (UFF), reforçou a importância de uma estrutura que permita a interoperabilidade de dados, com segurança e soberania.
O painel sobre Educação foi conduzido pelo assessor da Finep, Jorge Bittar, que provocou os participantes comentando os riscos relacionados ao uso da IA. "Como outras novas tecnologias disruptivas, a IA é sedutora, gera oportunidades, mas também representa ameaças, coloca países de maior atraso tecnológico em condição de subordinação às economias mais desenvolvidas, tem impactos climáticos e ambientais. Então, é preciso que seja bem regulamentada e tratada como algo estratégico para o desenvolvimento".
Para Ana Paula Massoneto, subsecretária de Inovação e Projetos Estratégicos da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, a IA é responsável por uma grande transformação de práticas pedagógicas. Ela comentou como essa transformação está sendo coordenada no Rio de Janeiro, que tem maior rede de educação municipal da América Latina, com 1557 escolas, 650 mil estudantes, 41 mil professores e 275 ginásios educacionais tecnológicos (GETs). "O nosso foco é o uso da IA na gestão. Temos trabalhado para que a IA possa liberar os educadores de tarefas administrativas e burocráticas para que eles foquem na missão pedagógica".
Guilherme Cintra, diretor de Inovação e Tecnologia da Fundação Lemann, comentou a atuação da Aliança de IA para a Educação, iniciativa da Fundação junto a outras organizações. "Tecnologia não resolve educação, mas pode contribuir. Nós mapeamos quatro frentes para desenvolvimento da IA: avaliação, tutoria para alunos, assessoria a professores e ensino da matemática", contou.
Hector Gusmão explicou como é o trabalho da Escola de Tecnologia 42 Rio, uma escola de engenharia de software gratuita. Ele pontuou como foco a integração com bases de dados, a escalabilidade de produtos digitais, a busca de soluções para desafios do mercado e a cooperação entre talentos. Roberta Freitas, professora de Letramento em IA, falou sobre a importância da capacitação de professores para o uso ético da IA.
Os participantes dos dois painéis apontaram que o Rio de Janeiro, por reunir diversas instituições de ensino e pesquisa, favorece a cooperação e a interdisciplinaridade. A secretária de Ciência, Tecnologia e Inovação do município, Tatiana Roque, acrescentou que, além dessa característica, há uma conjuntura favorável por conta da vontade política da Prefeitura. "O prefeito Eduardo Paes já demonstrou que tem desejo e empenho para transformar o Rio na capital da inovação com centralidade na agenda da inteligência artificial. O Rio AI City começa com um plano de infraestrutura de Data Center e desenvolvimento estratégico – que é justamente o foco deste seminário", afirmou.
Soluções inovadoras
Na mesa "Pitch de empresas de IA", foram apresentados cases inovadores de IA desenvolvidos por empresas com sede no Rio de Janeiro e aplicados em desafios práticos para a cidade. Participaram como palestrantes Francisco Alves, da Darma-AI Spin off do EloGroup, Nelson Leone, da Wide Labs, Rafael Franco, Tide Wise, Paulo Duarte da PD7 Tech, André Sih, da Furze Smart Solutions e Gustavo Pereira, da Elea Data Center.
Segundo os panelistas, o Rio tem potencial para se tornar uma referência como polo de IA e gerar mais desenvolvimento para além do turismo e da indústria de óleo e gás, com mais investimentos e integração do poder público, comunidade científica e empresas.
Gustavo Pereira, da Elea Data Center, que trabalha na implementação da parceria com a Prefeitura do Rio, a estrutura de data center do Rio AI City, pontuou que o projeto vai gerar mais de 10 mil empregos diretos e indiretos e foi estruturado de forma sustentável, sem risco de comprometer a demanda de energia necessária para a cidade.
Francisco Alves, da Darma, ressaltou que o desenvolvimento de SLMs (specialized language models) de IA para diversos modelos de negócios aumenta a eficiência e reduz em até 50 vezes o custo. A empresa devolveu o projeto em uma experiência com o Judiciário brasileiro. Rafael Franco, da TideWise, empresa de robótica especializada em soluções para tornar a indústria marítima e de óleo e gás mais sustentável e eficiente com o uso de IA, disse que a questão da infraestrutura de energia e conectividade ainda é um gargalo a ser resolvido para o desenvolvimento de projetos de IA na cidade e no país.
Paulo Duarte, da PD7 Tech, e André Sih, Furze Smart Solutions, apresentaram projetos IA que tornaram a cidade mais inteligente, entre eles, o "Dr. Carioca", triagem automatizada que organiza filas em unidades de saúde, identificando casos urgentes e atendimentos críticos; o "Olho Vivo", auditor de contratos e despesas de saúde com base em IA que detecta inconsistências em tempo real, aumentando a transparência, e o projeto de IA Profª Maré, tutor digital que adapta o conteúdo ao ritmo do aluno, entendendo as dificuldades e personalizando o conteúdo.
Sih, da Smart Solutions, apresentou o projeto Smart Vison, que por meio de IA aplicada a imagens, já criou soluções para inúmeras empresas como a Light, identificando até 1 milhão de pontos de iluminação pública na cidade do Rio de Janeiro.
Ao fim do seminário, ocorreu uma reunião de trabalho para elaborar um documento que norteará investimentos, ações e prazos para tornar o Rio como um polo de IA soberana e aberta, com base nas discussões realizadas durante o evento.
Veja também como foi o primeiro dia do evento.






